Autos n°: 0079.10.035.624-9
Autor: Ministério Público do Estado de Minas Gerais
Réus: Bruno Fernandes das Dores de Souza e Dayanne Rodrigues do Carmo Souza
Vistos, etc.
Bruno
Fernandes das Dores de Souza e Dayanne Rodrigues do Carmo Souza,
qualificados nos autos, foram regularmente processados nesta Comarca e,
ao final, pronunciados como incursos, o primeiro nas sanções do art.
121, § 2°, incisos I, III e IV, art. 148, § 1º, IV, em relação à vítima
Bruno Samúdio e art. 211, todos do Código Penal e a segunda, como
incursa nas sanções do art. 148, § 1º, IV, em relação à vítima Bruno
Samúdio.
Nesta data foi realizado o julgamento pelo Tribunal
do Júri, oportunidade em que os Senhores Jurados, ao votarem a primeira
série de quesitos em relação ao réu Bruno Fernandes das Dores de Souza,
no tocante ao crime de homicídio, por 04 (quatro) votos reconheceram a
materialidade do fato e a autoria. Por 04 (quatro) votos a 01(um) foi
afastada a tese de participação de crime menos grave e negado o quesito
absolutório. Por 04 (quatro) votos a 03(três) afastada a tese de
participação de menor importância. Por 04 (quatro) votos a 01(um) foi
reconhecida a qualificadora do motivo torpe. Por 04 (quatro) votos foram
reconhecidas as qualificadoras do emprego da asfixia e do recurso que
dificultou a defesa da vítima.
Proposta a segunda série de
quesitos, ainda em relação ao réu Bruno Fernandes das Dores de Souza,
quanto ao crime previsto no art.148, § 1º, IV, do CPB, contra a vítima
Bruno Samúdio, por 04 (quatro) votos a 03 (três) reconheceram a
materialidade do crime de sequestro. Por 04 (quatro) votos a 02 (dois),
foi negado o quesito absolutório. Por 04 (quatro) votos foi reconhecida a
qualificadora prevista no inciso IV, do § 1º, do art. 148 do CPB.
Na
terceira e última série de quesitos, quanto ao crime de ocultação de
cadáver, por 04 (quatro) votos reconheceram a materialidade. Por
04(quatro) votos contra 01 (um) voto foi reconhecida a autoria, sendo
por 04(quatro) votos a 02 (dois) negado o quesito absolutório.
Ao
votarem os quesitos em relação à ré Dayanne Rodrigues do Carmo Souza,
no tocante ao crime do art.148, § 1º, IV, do CP contra a vítima Bruno
Samúdio, por 04 (quatro) votos reconheceram a materialidade. Por
04(quatro) votos contra 01 (um) voto foi reconhecida a autoria, sendo
por 04(quatro) votos a 03 (três) foi afirmado o quesito absolutório.
Assim
exposto e considerando a vontade soberana do Júri, declaro o réu Bruno
Fernandes das Dores de Souza incurso nas sanções do art. 121, § 2°, I,
III e IV, art.148, § 1º, IV, e art. 211, todos do CPB. Absolvo a ré
Dayanne Rodrigues do Carmo Souza do crime previsto no art.148, § 1º, IV,
do CP. Passo à dosimetria da pena.
Réu Bruno Fernandes das
Dores de Souza, pelos crimes do art. 121, 2°, I, III e IV, do CP e art.
148, § 1º, IV, do CP, art. 211 do CPB:
Culpabilidade. A
culpabilidade dos crimes é intensa e altamente reprovável. O crime
contra a vida praticado nestes autos tomou grande repercussão não só
pelo fato de ter entre seus réus um jogador de futebol famoso, mas
também por toda a trama que o cerca e pela incógnita deixada pelos
executores sobre onde estariam escondidos os restos mortais da vítima.
Embora para esta indagação não se tenha uma resposta, certamente pela
eficiência dos envolvidos, a sociedade de Contagem que em outro
julgamento já tinha reconhecido o assassinato da vítima, hoje reconheceu
o envolvimento do mandante na trama diabólica.
A investida
do réu contra a vítima não foi a primeira vez, mas certamente foi a
última. Ficou cristalino o interesse do réu em suprimir a vida de Elisa
Samúdio. Agiu sempre de forma dissimulada da sua real intenção.
Assim
Elisa foi sequestrada no Rio de Janeiro e trazida cativa para o sítio
em Esmeraldas, onde ficou por quase uma semana esperando a
operacionalização de sua morte. O desenrolar do crime de homicídio conta
com detalhes sórdidos e demonstração de absoluta impiedade. A
culpabilidade é pelos mesmos motivos, igualmente acentuada em relação ao
crime de sequestro tendo como vítima a criança Bruno Samúdio, sendo
igualmente intensa e reprovável em relação ao crime de ocultação de
cadáver. O réu Bruno Fernandes acreditou que consumindo com o corpo, a
impunidade seria certa.
Conforme se infere das folhas de
Antecedentes Criminais de f. 9.519/9.523, 9.724/9.727 e 9.638 bem como
Certidões de Antecedentes Criminais de f. 9.524/9.525, 9.686, 9.667,
9.654/9.655, 9.8361, 13.106/13.110, 9.653 e 15.228 o réu embora
tecnicamente primário já conta com condenação criminal, de modo que não
pode ser tido como de bons antecedentes. A circunstância atinente à
conduta social não lhe favorece, eis que há informações nos autos de que
tinha envolvimento com o tráfico de drogas (f. 15865/15870). A conduta
social é igualmente desfavorável considerando o comprovado envolvimento
do réu Bruno Fernandes na face obscura do mundo do futebol. No tocante à
personalidade tal circunstância, igualmente não favorece ao acusado,
uma vez que demonstrou ser pessoa fria, violenta e dissimulada. Sua
personalidade é desvirtuada e foge dos padrões mínimos de normalidade. O
réu tem incutido na sua personalidade uma total subversão dos valores.
Os motivos do crime de homicídio já foram apreciados para efeito de
reconhecimento da qualificadora do motivo torpe. Os motivos dos crimes
de sequestro da vítima Bruno Samúdio e do crime de ocultação de cadáver,
não serão interpretados desfavoravelmente, tendo em vista que a
motivação exsurgida, no caso em apreço, foi inerente aos tipos penais.
As circunstâncias não o favorecem uma vez que a vítima foi atraída para o
Rio de Janeiro, onde permaneceu hospedada em hotel, às expensas do réu,
até o momento de seu sequestro no dia 04.06.2010, quando foi agredida e
rendida com a concorrência do corréu Luiz Henrique Ferreira Romão e do
então adolescente Jorge Luiz. Foi levada para a casa do acusado Bruno
Fernandes, no Recreio dos Bandeirantes/RJ e de lá foi trazida para Minas
Gerais, onde ficou igualmente cativa, juntamente com seu bebê e
permaneceram sucumbidos até o dia em que Elisa foi levada para as mãos
de seus executores. Tais circunstâncias demonstram a firme disposição
para a prática do homicídio que teve a sua execução meticulosamente
arquitetada. As circunstâncias do sequestro do bebê, são pelos mesmos
fundamentos desfavoráveis. Também não lhe favorecem as circunstâncias da
ocultação de cadáver. A supressão de um corpo humano é a derradeira
violência que se faz com a matéria, num ato de desprezo e vilipêndio. As
conseqüências do homicídio foram graves, eis que a vítima deixou órfã
uma criança de apenas quatro meses de vida. As consequências quanto ao
crime de seqüestro da criança são igualmente desfavoráveis, eis que, no
primeiro dia do crime ficou, inclusive privada da companhia de sua mãe
que tinha sido agredida na cabeça. Foi, ainda, privada de sua liberdade
do decorrer dos dias seguintes e depois da execução de sua mãe, passou
pelas mãos de diversas pessoas igualmente estranhas. As circunstâncias
do crime de ocultação de cadáver, não serão interpretadas em seu
desfavor, uma vez que não foram reveladas. No tocante ao comportamento
das vítimas, não constam nos autos provas de que tenha havido por parte
delas qualquer contribuição. Registro que o fato de a vítima Elisa estar
cobrando o reconhecimento do filho e respectiva pensão não eram motivos
para serem alvos de tão bárbaros delitos.
Com tal
diagnóstico, na 1ª. fase, em relação ao crime do art. 121, 2°, I, III e
IV, do CPB com preponderância das circunstâncias desfavoráveis e
reconhecidas as qualificadoras do motivo torpe, do emprego de asfixia e
recurso que dificultou a defesa da vítima, fixo a pena base em 20
(vinte) anos de reclusão.
Na 2ª fase, registro que
durante todo o processo o réu negou qualquer envolvimento no crime,
inclusive por ocasião do seu interrogatório ocorrido na data de ontem.
Naquele depoimento, prestou esclarecimentos, identificando o executor do
homicídio. Hoje, o réu, pediu para ser novamente ouvido, oportunidade
em que reconheceu que sabia que a vítima Elisa Samúdio iria morrer. Não
quis mais responder às perguntas. Data vênia, mas essa lacônica
confissão não merece a mesma redução concedida ao corréu Luiz Henrique
Ferreira Romão, no julgamento passado como quer a defesa.
Naquela
ocasião consignei que a admissão do réu Luiz Henrique de que realmente
tinha levado Elisa Samúdio para ser executada, ao afirmar que a levou ao
encontro com a morte, colocou uma pá de cal na discussão criada desde o
início pela defesa dos acusados que sempre afirmou que Elisa estava
viva.
Dessarte, dou à confissão do réu Bruno Fernandes hoje
no Plenário valoração que permite a redução pela atenuante em 03 (três)
anos, ficando, pois, fixada em 17 (dezessete) anos de reclusão.
Reconheço
a agravante do art. 62, I, CPB, eis que sustentado no Plenário pela
acusação que o réu agiu na qualidade de mandante da execução da vítima,
fato este comprovado nos autos pela prova oral, mormente pela delação do
corréu Luiz Henrique às f. 15898/15.909, de modo que majoro a pena de
06 (seis meses). A pena final, portanto, perfaz 17 (dezessete) anos e 06
(seis) meses de reclusão. Na 3º fase, registro que não há causas
especiais de oscilação. A pena será cumprida em regime inicialmente
fechado.
No tocante ao crime do art. 148, § 1º, IV, do CP, já
analisadas as circunstâncias judiciais, na sua maioria desfavoráveis,
na 1ª. fase, fixo a pena base em 3 (três) anos de reclusão. Na 2ª fase,
registro que não há atenuantes, havendo a agravante do art. 61, II, e,
do CPB, eis que o crime foi praticado contra descendente, motivo pelo
qual, majoro a pena de 03(três) meses. Na 3ª fase, não há causas
especiais de oscilação, motivo pelo qual, fica a reprimenda,
concretizada em 3 (três) anos e 3 (três) meses de reclusão. A pena será
cumprida em regime aberto.
No tocante ao crime do art. 211 do
CP, já analisadas as circunstâncias judiciais, na sua maioria
desfavoráveis, na 1ª. fase, fixo a pena base em 1 (um) ano e 06 meses de
reclusão. Na 2ª fase, registro que não há atenuantes ou agravantes. Na
3ª fase, não há causas especiais de oscilação, motivo pelo qual, fica a
reprimenda, concretizada em 1 (um) ano e 6 (seis) meses de reclusão. A
pena será cumprida em regime aberto.
Ficam, pois, as penas totalizadas em 22 (vinte e dois) anos e 03 (três) meses de reclusão, nos termos do art. 69 do CPB.
Custas pelo réu Bruno Fernandes.
O
réu foi preso por prisão preventiva mantida por ocasião da pronúncia.
Nesta oportunidade, diante do resultado do julgamento, persistem os
requisitos da custódia cautelar. Ademais, não se pode perder de vista a
gravidade concreta dos delitos, indicada pelo modus operandi com que os
crimes foram perpetrados, como no caso em que, além da violência
praticada contra Elisa Samúdio, há ainda, a perversidade com a qual foi
destruído e ocultado o seu cadáver, impedindo, inclusive um sepultamento
digno para que fosse minimamente homenageada por seus familiares e
amigos.
Indiscutível se torna registrar, que os crimes descritos
nestes autos, causam extremo temor no seio da sociedade, não podendo o
Poder Judiciário fechar os olhos a esta realidade, de modo que a paz
social deve ser preservada, ainda que, para tal, seja sacrificada
algumas garantias asseguradas constitucionalmente, dentre elas, a
liberdade individual.
Não há, ainda, como deixar de falar da
natureza de um dos delitos em análise, qual seja, homicídio triplamente
qualificado, considerado hediondo, a teor do artigo 1º, inciso I, da Lei
nº 8.072/90, crime doloso, punido com pena de reclusão, dotado, pois,
de maior censurabilidade jurídico-penal.
Por todo o exposto, o réu não poderá recorrer em liberdade.
Transitada em julgado:
1
- Comunique-se a condenação ao TRE para atendimento ao art. 15, III, da
CF/88 e aos Órgãos de identificação criminal nos termos do art. 809 do
Código de Processo Penal.
2 - Encaminhe-se Guia de Execução à VEC.
Oportunamente, arquivem-se os autos com baixa na distribuição.
Sentença publicada em plenário e dela intimadas as partes.
Registre-se. Sala de Sessões do Tribunal do Júri.
Comarca de Contagem, 08 de março de 2013.
(a) Marixa Fabiane Lopes Rodrigues
Juíza de Direito
Fonte: TJ-MG - 8/3/2013
Postado por http://www.jurisway.org.br
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