No reembolso de despesas com assistência médica e suplementares
(DAMS), cobertas pelo Seguro Obrigatório de Danos Pessoais Causados por
Veículos Automotores de Via Terrestre (DPVAT), o hospital particular que
atendeu vítimas de acidente de trânsito tem o direito de receber pelo
que comprovadamente foi gasto, até o limite de oito salários mínimos por
pessoa, independentemente de valores inferiores fixados em resoluções
do Conselho Nacional de Seguros Privados (CNSP).
O entendimento é da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça
(STJ). Por maioria, seguindo voto do ministro Villas Bôas Cueva, a Turma
negou recurso da Bradesco Seguros S.A. em processo movido contra ela
pela Associação Paranaense de Cultura (APC), entidade filantrópica
mantenedora do Hospital Cajuru, localizado no Paraná.
Ficou decidido que a seguradora terá de reembolsar integralmente a
APC pelas despesas de assistência médica e suplementares devidas às
vítimas de acidentes de trânsito atendidas pelo Hospital Cajuru. O
reembolso deve respeitar o limite legal máximo previsto no artigo 3°,
alínea “c”, da Lei 6.194/74, de oito salários mínimos, e não o limite
estabelecido na tabela adotada pela seguradora com base em resolução do
CNSP, que fixa valores acima da tabela do SUS, adotando os parâmetros do
mercado, porém, com teto inferior ao valor máximo previsto na lei.
“Enquanto não houver permissão legal para adoção de uma tabela de
referência que delimite as indenizações a serem pagas pelas seguradoras a
título de DAMS, não pode o valor máximo ser reduzido por resoluções”,
concluiu o ministro Villas Bôas Cueva.
Cessão de crédito
Na origem, a APC, portando instrumento de cessão de crédito de 585
vítimas de acidentes de trânsito, propôs ação de cobrança contra a
seguradora visando o reembolso das despesas de assistência médica, nos
termos dos artigos 3º e 5º da Lei 6.194, dentro do limite legal de oito
salários mínimos por pessoa.
Segundo a associação paranaense, as vítimas foram atendidas em
hospital privado, não pagaram pelo atendimento e cederam os direitos à
instituição para cobrar os valores diretamente do convênio de
seguradoras que participam do sistema do seguro obrigatório (DPVAT).
“Inclusive há casos em que as despesas com a vítima são superiores ao
teto legal (oito salários mínimos), contudo, em observância ao artigo
3º, alínea ‘c’, da Lei 6.194, nenhum pedido de reembolso ultrapassou
esse limite legal, ficando o prejuízo a cargo da autora”, afirmou a APC.
Em primeira instância, a seguradora foi condenada ao pagamento das
indenizações relativas às despesas médico-hospitalares cobertas pelo
seguro obrigatório, nos termos do pedido. A Bradesco Seguros recorreu.
Apelação
O Tribunal de Justiça do Paraná (TJPR), ao julgar a apelação da
seguradora, manteve a sentença por entender que, apresentada a
documentação comprobatória exigida por lei, o hospital tinha o direito
de receber o reembolso das despesas realizadas no atendimento prestado
aos pacientes envolvidos em acidentes de trânsito.
O TJPR concluiu que o reembolso deve ser integral, correspondendo ao
valor estritamente comprovado das despesas de assistência médica,
respeitado o limite de oito salários mínimos por pessoa, estabelecido em
lei, e não com base na tabela de parâmetros de seguro DPVAT adotada
pela seguradora, com base na resolução do CNSP.
Legalidade da tabela
Inconformada, a seguradora recorreu ao STJ sustentando que o CNSP tem
competência para expedir normas disciplinadoras para pagamento das
indenizações do seguro obrigatório. Afirmou que é legal a tabela de
valores referentes ao pagamento dos procedimentos efetuados nos
pacientes atendidos em hospitais particulares.
Alegou, ainda, que a cobrança efetuada pelo hospital sem controle dos
valores atribuídos aos procedimentos contribui para a ocorrência de
fraudes.
A mantenedora do hospital, por sua vez, argumentou que se a Lei 6.194
estabelece valores e procedimentos para liquidação dos sinistros, um
artigo dessa mesma lei não poderia atribuir ao CNSP competência para
fixar valores diversos. Por essa razão, afirmou, não há amparo legal
para embasar o tabelamento pretendido pela seguradora.
Voto vencido
O relator do caso, ministro Sidnei Beneti, ficou vencido. Ele havia
votado no sentido de que fosse observada a tabela expedida pelo CNSP
para pagamento de DAMS. Segundo o ministro, não há conflito entre a
resolução questionada e a lei, que apenas efetua o tabelamento dos
preços dos serviços prestados como referência para as indenizações.
No âmbito de seguro de saúde privado, de acordo com o ministro
Beneti, a utilização das tabelas de preço para os serviços é uma forma
de evitar o superfaturamento, que poderia onerar ou mesmo inviabilizar o
sistema.
Previsão legal
A maioria da Terceira Turma, no entanto, acompanhou a posição
divergente do ministro Villas Bôas Cueva. Segundo ele, a Lei 6.194
dispõe que “cabe ao CNSP fiscalizar e normatizar os serviços da
seguradora, não alterar limites para indenização”.
Para o ministro, “o dever da seguradora era pagar até oito salários
mínimos por procedimento médico-hospitalar, conforme documentação que
lhe foi apresentada, não podendo alterar, unilateralmente, o referido
teto pelo valor fixado na tabela da resolução do CNSP”.
Quanto à possibilidade de fraude, o ministro Cueva citou trecho da
sentença, segundo o qual a seguradora não apontou de forma objetiva
nenhum fato que pusesse em dúvida, nesse aspecto, as contas apresentadas
pelo hospital. “De qualquer modo, a própria Lei 6.194 permite à
seguradora, nos casos em que há suspeita de fraude, solicitar
esclarecimentos já quando do protocolo do pedido de reembolso, além de
informar ao órgão competente”, concluiu.
Processos: REsp 1139785
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