quarta-feira, 13 de fevereiro de 2013

Supremo estuda fim das férias de 60 dias de juízes




Judiciário. Marco Aurélio Mello (sentado) é contra o fim das férias de 60 dias, tema que será analisado por comissão criada por Joaquim Barbosa
Foto: Gustavo Miranda/09-10-2012



Judiciário. Marco Aurélio Mello (sentado) é contra o fim das férias de 60 dias, tema que será analisado por comissão criada por Joaquim Barbosa Gustavo Miranda/09-10-2012
BRASÍLIA Férias de 60 dias para juízes e procuradores, privilégio concedido às duas categorias durante a ditadura militar, podem estar perto do fim. Cresce dentro das cúpulas do Judiciário e do Executivo um movimento para pôr fim ao mais longo período de ócio remunerado a profissionais bancados com dinheiro público. O presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Joaquim Barbosa, decidiu criar uma comissão especial para revisar e mandar para o Congresso projeto de lei sobre o assunto, um dos principais tópicos da Lei Orgânica da Magistratura Nacional (Loman).
Pelo menos três dos mais influentes ministros do STF entendem que não há sentido em manter o mimo para juízes e procuradores, em detrimento de todas as demais categorias profissionais do país.
Com as folgas dos recessos de fim de ano e os feriados nacionais, estaduais e municipais, juízes e procuradores somam mais de 90 dias de ócio por ano. Não há nada parecido em nenhum outro país. Não satisfeitos com os excessos, alguns juízes e procuradores vendem parte das folgas para fazer caixa extra. Por lei, juízes não podem vender férias.
— Juiz não precisa de férias de dois meses. O que o juiz tem que fazer é organizar o gabinete e trabalhar — disse ao GLOBO um dos ministros do STF.
Ele pediu para não ter seu nome divulgado, porque não quer despertar a animosidade de parte dos juízes antes do início formal das discussões sobre o assunto. A ministra Eliana Calmon, vice-presidente do Superior Tribunal de Justiça (STJ), também não vê motivo para tratamento especial a juízes. Para ela, a reforma da Loman está atrasada em muitos anos. Pela Constituição, a competência de propor mudança no regime geral da magistratura é do presidente do STF.
— Sou contra, porque acho que o juiz é um profissional como outro qualquer. Acho que nós não podemos ter privilégios. Como é que um juiz vai julgar os outros se ele tem uma vida diferente? — disse a ministra.
O fim das regalias é tema candente também no governo federal. O secretário de Reforma do Judiciário, Flávio Caetano, entende que chegou a hora de colocar o assunto na agenda política do país. A secretaria, vinculada ao Ministério da Justiça, teve papel fundamental na criação do Conselho Nacional de Justiça (CNJ).
— Férias de 60 dias foram concebidas em 1979. Se as condições de 1979 persistem, tem que ser discutido. Se temos juiz que vende férias, há algo errado. Ou os juízes ganham mal e precisam ser recompensados ou não precisam de férias de 60 dias — disse Caetano.
MUDANÇA DE ABORDAGEM
A simples declaração do secretário já é uma indicação da importância que o assunto vem ganhando nos últimos meses. Desde o início do mandato da presidente Dilma Rousseff, o Ministério da Justiça vinha adotando extrema cautela ao tratar das atribuições originais do Judiciário ou do Legislativo. O passo à frente do secretário sinaliza mudança na abordagem da questão.
As férias de 60 dias de juízes e procuradores têm custo elevado, atrasam o andamento de processos e até afetam a atividade econômica do país. Processos lentos retardam decisões, atingem direitos e atrapalham negócios.
— Há uma contradição entre a defesa da existência dos 60 dias de férias, por razões de saúde do magistrado, e, do outro lado, a possibilidade de indenização pelos dias não gozados. Não há como conviver com esses dois sistemas — afirmou Bruno Dantas, um dos conselheiros do CNJ.
A proposta de reforma da Loman está engavetada no STF há 25 anos. Com o fim da ditadura militar e a promulgação da nova Constituição, o projeto de adequação da lei às necessidades do regime democrático teria que ter sido enviado ao Congresso Nacional desde 1988. Mas, com receio de desagradar ao lobby dos juízes ou simplesmente por concordar com o privilégio, ministros que passaram pela presidência do STF desde então não levaram adiante o debate sobre as benesses do governo militar para a magistratura.
Com o capital político em alta desde o julgamento do mensalão, Joaquim Barbosa entende que pode quebrar o tabu. Barbosa quer aprovar o novo Estatuto da Magistratura ainda este ano. Decidiu criar uma comissão para revisar o projeto de reforma da Loman elaborado pelo ministro Ricardo Lewandowski na gestão do ex-presidente Ayres Britto. A comissão deve ser coordenada pelo ministro Gilmar Mendes.
O presidente do STF também tratou da reforma da Loman com o presidente da Câmara, Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN), na última quarta-feira.
Uma das tarefas de Barbosa será vencer dificuldades internas. O ministro Marco Aurélio Mello defende as férias de 60 dias para juízes. Ele diz que usa parte dos dias de folga para diminuir o estoque de processos em seu gabinete e presume que outros juízes façam o mesmo.
— Com a magistratura sobrecarregada como está, o juiz acaba tirando um dos meses para tentar atualizar o serviço. Nós, que pegamos no pesado, trabalhamos sábado, domingo e feriados. Eu, por exemplo, fiquei em Brasília nos sete primeiros dias de férias trabalhando, em dezembro — disse o ministro.
A resistência à mudança é forte, mas já começou a diminuir. A Associação dos Juízes Federais (Ajufe), tradicionalmente refratária a qualquer perda de privilégio, já admite o fim da regalia. Para o presidente da entidade, Nino Toldo, é possível discutir o assunto com duas condições. Uma delas é que o corte de benefícios se estenda também ao Ministério Público. A outra é que a redução das folgas seja compensada com outras vantagens.
— Não me incomoda o fim das férias de 60 dias se tiver um pacote de atratividade para a magistratura — disse Nino Toldo.
O ex-ministro do STF Ayres Britto também defende que o tema volte a ser discutido.
— Esse é um tema que está merecendo uma rediscussão com as associações, os tribunais e a própria sociedade — afirmou.

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Fonte:STF
Ailton de Carvalho (Email)
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